Na 17ª CNS, Projeto Integra debate acesso a medicamentos e tecnologias no SUS
Durante a 17ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em Brasília, de 2 a 5 de julho, uma atividade autogestionada com o tema “Acesso a Medicamentos e Novas Tecnologias” organizada pelo Projeto Integra, reuniu especialistas e participantes para discutir o tema de forma abrangente, promovendo um debate enriquecedor.
Coordenado pelo Presidente da Fenafar, Fábio Basílio, o debate oportunizou a participação de diversas pessoas, promovendo um diálogo construtivo e incentivando a troca de ideias e experiências entre os palestrantes e os participantes presentes.
A professora da UFSC e coordenadora geral do Instituto Escola Nacional de Farmacêuticos (ENFar), Silvana Nair Leite, iniciou o debate apresentou os fundamentos e objetivos do Projeto Integra em todas as suas fases.
Promovido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), pela Escola Nacional dos Farmacêuticos (ENFar) e com o apoio da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar), o Projeto Integra tem como propósito mobilizar a população para enfrentar as condições sanitárias, sociais e políticas desafiadoras tanto no presente como no futuro próximo.
O Projeto Integra busca formar lideranças e promover a mobilização social, integrando as políticas e práticas de Vigilância em Saúde, Assistência Farmacêutica, Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde, por meio de estratégias participativas e movimentos sociais.
Seu público-alvo envolve conselheiros de saúde, membros de movimentos sociais, profissionais e gestores da saúde, professores, pesquisadores e estudantes interessados em atuar no cenário político e social por meio da integração das políticas de saúde.
O Projeto Integra já realizou quatro fases. A primeira incluiu cursos de formação de lideranças, para a Integração de três eixos, as políticas de Vigilância em Saúde, de Assistência Farmacêutica e de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde.
Na segunda fase ocorreram encontros regionais contemplando o debate dos problemas enfrentados na saúde a partir das vivências dos territórios e a apresentação de propostas concretas de políticas públicas de saúde buscando promover, com enfoque na participação social, os três eixos do programa
O 9º Simpósio Nacional de Ciência, Tecnologia e Assistência Farmacêutica (9º SNCTAF) faz parte da terceira fase. Reuniu cerca de 200 lideranças de diversos setores da sociedade, em particular, de institutos de pesquisa, universidades, gestão pública, setor produtivo e controle social da saúde e abordou todos os apontamentos e propostas discutidas nas fases anteriores do projeto Integra.
Durante o Simpósio, foi construída a “Carta do Rio de Janeiro”, um documento que apresenta uma agenda para a integração das políticas de Assistência Farmacêutica, Vigilância em Saúde e Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde para um projeto nacional de desenvolvimento na próxima década.
Além disso, ocorreram debates em formato de audiências Públicas nas Assembleias Legislativas e ou Câmaras Municipais de Vereadores sobre as políticas de Assistência Farmacêutica, Vigilância em Saúde e Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde, e os resultados da 9ª SNCTAF com o objetivo de mobilizar para a 17ª Conferência Nacional de Saúde.
A realização da Conferência Livre de Acesso a Medicamentos em Defesa da Vida na Câmara dos Deputados em Brasília, contou com grande participação e possibilitou a eleição de 3 pessoas delegadas à 17a CNS.
O Projeto Integra também resultou na publicação de três livros: 1) Material didático para formação de lideranças em saúde, com o material do curso realizado em 2021. 2) Solidariedade ou Apartheid? Lições aprendidas na pandemia, de Jorge Bermudez, com um apanhado dos textos publicados pelo autor de 2020 a 2022 e 3) Políticas públicas integradas para fortalecer o SUS – Um projeto nacional e participativo de desenvolvimento social. Todos os livros disponíveis para livre consulta.
Em sua manifestação, Gonçalo Vecina Neto, ex-presidente da ANVISA e professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, destacou a importância de considerar diferentes atributos para garantir o acesso a medicamentos, como investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação, bem como a capacidade nacional de desenvolver e produzir medicamentos necessários ao SUS.
Ele ressaltou a necessidade de superar as fragmentações existentes na Assistência Farmacêutica no SUS, como a disseminação da Farmácia Popular em pequenos e médios municípios e nas periferias das grandes cidades, além da incorporação de tecnologias para aprimorar suas atividades e a ampliação do elenco de medicamentos, incluindo ações relacionadas ao cuidado e serviços farmacêuticos.
Vecina também enfatizou a importância de garantir a produção de medicamentos no Brasil, estimulando o desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS), a produção de medicamentos biológicos, por meio de parcerias para o desenvolvimento produtivo (PDPs) e a necessidade de recursos para o desenvolvimento de tecnologias que suportem licenças compulsórias, baseadas em políticas públicas consistentes.
Destacou ainda a necessidade do estímulo à formação de doutores e do desenvolvimento de pesquisas para a geração de conhecimentos, incluindo a internalização de capacidades para a incorporação de Boas Práticas de Pesquisas Clínicas.
Defendeu a farmácia com um estabelecimento de saúde com política pública que defina suas diretrizes, limites e responsabilidades, e a transformação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde – Conitec em uma empresa independente.
Julieta Palmeira, assessora da Presidência da Finep/MCTI para o Complexo Econômico Industrial da Saúde, ressaltou a importância da democratização do acesso, indo além do básico e considerando todas as demandas dos usuários do SUS.
Ela enfatizou a necessidade de reconstruir a Política Nacional de Saúde (PNS) e a Política Nacional de Assistência Farmacêutica (PNAF), valorizar a atenção primária em saúde, restabelecer e evoluir as bases do desenvolvimento do CEIS e estimular parcerias para o desenvolvimento autônomo, soberano e sustentável do país.
Julieta Palmeira destacou a importância de adotar licenças compulsórias (quebra de patentes) que permitam o desenvolvimento interno de tecnologias de interesse do país e do SUS, além de políticas intersetoriais que incorporem as perspectivas estratégicas da saúde, como equidade de gênero, ampliação do acesso à saúde com inclusão social e desenvolvimento econômico com superação da pobreza.
Propôs ainda a reconstrução da Política Nacional de Saúde e do Plano Nacional de Saúde, com financiamento adequado e suficiente do SUS, tendo por base uma política econômica que considere a não existência de um teto de gastos, mas com piso que atenda as demandas do SUS; a ampliação efetiva do financiamento; e investimento amplo garantindo o direto à saúde.
Durante o debate, diversas intervenções do público destacaram questões relevantes relacionadas ao acesso a medicamentos e tecnologias no SUS. Alguns dos principais pontos abordados foram:
Importância do controle social do SUS e a necessidade de considerar as demandas dos movimentos sociais na formulação de políticas públicas.
Judicialização da saúde e a necessidade de garantir financiamento adequado, ações de assistência farmacêutica e inclusão de novas terapias no SUS.
Desenvolvimento de apresentações pediátricas de medicamentos e estímulo à incorporação nacional de medicamentos e tecnologias para tratamento de doenças raras.
Valorização e inclusão das plantas medicinais no contexto científico em favor dos usuários do SUS.
Participação das mulheres nos processos científicos, técnicos, sociais e políticos, ocupando espaços políticos-institucionais e avançando nas estruturas de decisão.
Necessidade de ampliar o acesso a tratamentos individualizados para o câncer no SUS, com prioridade para diagnósticos e tratamentos precoces.
Combate ao racismo, disponibilidade de tratamento de quimioterapia nos municípios e inserção de profissionais farmacêuticos nos estabelecimentos privados.
Acesso a terapia nutricional no SUS e sua incorporação nos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas.
Garantia de acesso a medicamentos de alto custo, tratamentos individualizados e políticas públicas de apoio aos profissionais do SUS.
Ampliação do Programa Farmácia Popular do Brasil, acesso aos produtos de cannabis e a revisão do elenco de medicamentos destinados a grupos específicos.
Redução dos tempos para análise e incorporação de tecnologias no SUS, acompanhando os padrões internacionais.
Produção nacional de medicamentos de interesse do SUS como forma de evitar a falta de medicamentos e garantir o acesso adequado.
Essas intervenções do público refletem a diversidade de preocupações e desafios enfrentados na busca por um acesso mais amplo e equitativo a medicamentos e tecnologias no âmbito do SUS.
Após as intervenções, os participantes da mesa reforçaram a importância de democratizar o acesso à saúde, garantir políticas públicas consistentes, desenvolver tecnologias no país, estimular o desenvolvimento científico e produtivo e promover a reconstrução da Política Nacional de Saúde com financiamento adequado para o SUS.
Uma das conclusões foi de que o debate aprofundou temas essenciais para o acesso a medicamentos e tecnologias no SUS, destacando a necessidade de integrar políticas e práticas de saúde, fortalecer a atenção primária, investir em pesquisa e desenvolvimento, promover parcerias estratégicas para o desenvolvimento produtivo e adotar licenças compulsórias quando necessário.
Também foi apontada a importância de reconstruir a Política Nacional de Saúde com base na valorização da assistência farmacêutica, na democratização do acesso e no desenvolvimento sustentável do país.
Josemar Sehnem – ENFar – Com informações do relator da atividade Norberto Rech.